Por Juliana Márcia Pires
Passados quase 5 anos da reforma trabalhista, nota-se que pouca coisa mudou nas relações de trabalho, bem como nas relações processuais trabalhistas.
As modificações que se mantiveram após o crivo dos tribunais foram poucas e sutis, não tendo o esperado efeito de modernização das relações de trabalho e diminuição de ações trabalhistas.
O trabalhador continua a ser tutelado pelo estado com pouco ou nenhum poder de negociação e as relações de trabalho continuam engessadas pela burocratização das regras da secretaria do trabalho com um verniz de avanço tecnológico já que todo o registro funcional atual é feito de modo online.
O excesso de tributação continua a inibir a expansão do mercado de trabalho e as taxas de judicialização continuam altas, especialmente após a decisão das cortes superiores sobre a simplificação das regras da justiça gratuita e o pressuposto da boa fé na justiça do trabalho em favor do Reclamante, sempre ele, o rei do processo, a parte supostamente “hipossuficiente”, o empregado.
Muito já foi dito sobre a hipossuficiência laboral, especialmente em tempos de conhecimento amplo, livre e gratuito, gerado pelo avanço tecnológico atual, há muito se foi a época da inocência e já não existe aquela figura do trabalhador que não tinha ciência de seus direitos e poderes de negociação.
A reforma que visava atacar a hipossuficiência e transformar o trabalhador em um ser pensante que poderia decidir entre outras coisas quando ser um assalariado com direitos e deveres laborais e quando ser dono de seu próprio nariz decidindo pelo trabalho autônomo, também visava simplificar as relações laborais deixando as partes o poder de acerto e negociação.
Fracassou largamente, não por falta de boas e más ideias, mas porque atacou o instrumento errado, a reforma não pode ser da CLT, já que os princípios basilares do direito trabalhista são constitucionais e o artigo 7 da constituição de 1988 não foi modificado.
A CF/1988 determina o tom e a cadencia da relação laboral através dos seguintes princípios:
PRINCÍPIOS QUE NORTEIAM O DIREITO DO TRABALHO
PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO DO TRABALHO
- Princípio da Progressão Social: exs. CF/88 arts. 3º. II e III, 7º. Caput e 193, Lei do FGTS, Lei do Seguro Desemprego.
- Princípio Tutelar (ou protetivo): “in dubio pro perário”, aplicação da norma mais favorável, regra da condição mais benéfica. Vale tanto para o direito material quanto para o processual. Tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais CF/88 art. 7º. Caput.
- Princípio da autodeterminação coletiva: a autonomia da vontade cede lugar em favor da coletividade. Tudo o que disposto pelos sindicatos contratualmente vincula os sujeitos individuais da relação de trabalho. A vocação coletiva é a essência do Dir.Trabalho – CF/88 arts. 7º. VI, XIII, XIV, XXVI; art. 8º. VI, CLT arts. 611, 856.
- Princípio da Irretroatividade das nulidades contratuais: no D.Trabalho a nulidade absoluta somente retroage (ex tunc) se o objeto da prestação for o serviço ilícito, mesmo assim, alguns tribunais ainda invocam o princípio tutelar para proteger o trabalhador de boa-fé., CF/88 art.5º e 7º.
PRINCÍPIOS ESPECÍFICOS DO DIREITO DO TRABALHO
- Princípio da norma favorável ao empregado – ignora-se a hierarquia das fontes;
- Princípio “in dubio pro perário” – casos de desconfiguração da justa causa, por ex.
- Princípio da condição mais benéfica ao trabalhador – CF/88 art. 7º., . 468, CLT e 620, CLT
- Princípio da Irrenunciabilidade dos Direitos Trabalhistas – fundamenta-se no vício de consentimento próprio da hipossuficiência econômica e/ou cultural, bem como no dever do Estado de tutelar o empregado. Não se permite o ACORDO (mesmo que judicial) sobre direitos incontroversos, a transigência presume a dúvida – necessidade de prova. CF/88 art. 7º. incVI.
- Princípio da Continuidade da Relação de Emprego: Histórico: a estabilidade decenal – 492, CLT. Atual: art. 7º. Inc. I da CF/88, previsões de estabilidade provisória (cipeiro, gestante, dirigente sindical, etc). Impecilhos à descontinuidade: multa de sobre os depósitos do FGTS, aviso prévio, 477 CLT, 467 CLT, indenização das férias +1/3 e natalinas com o cômputo do aviso prévio, indenização equivalente a um salário qdo dispensa se der no trintídio que antecede a data base da categoria, etc. A Conveção 158 da OIT – art. 4º.: “Não se dará término à relação de trabalho de um trabalhador a menos que para isto exista uma causa justificada relacionada com sua capacidade ou seu comportamento ou baseada nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço”.
- Princípio da Primazia da Realidade: CF/88 art. 7º., 442, CLT. Distinguem-se duas coisas: o contrato que se ajusta (Forma/Direito) e o que efetivamente se realiza (Conteúdo/Fato), dando-se primazia à segunda. Abarca: simulações, erros, falta de atualizações, falta de requisitos formais, etc.
- Princípio da Razoabilidade: CF/88 art. 6º e 7º. onde se busca a verdade dos fatos a partir de princípios razoáveis, apesar da formalidade documental. Ex: identificação de “testas de ferro”, de forjadas situações de trabalho autônomo, de abandono de emprego, de pedido de demissão, etc.
- Princípio da Imodificabilidade “in pejus” do contrato de trabalho: CF/88 art. 7º. caput, o contrato de trabalho individual não pode ser modificado em prejuízo do empregado, com ou sem a sua anuência (468, CLT) – Transferências de localidade. Questão da empregabilidade e flexibilização nas relações de emprego. O papel dos sindicatos.
- Princípio da Irredutibilidade salarial: albergado pela CF/88 – art. 7º e seus incisos.Princípio da Igualdade de Salário: definido nos CF/88 art. 7º. inciso Xxe XXX, arts. 5 e 461 da CLT. Requisitos: Identidade de funções (de fato e não meramente documental), igualdade do valor do trabalho (igual produtividade e perfeição), diferença de tempo entre os paradigmas não superior a 2 anos, trabalho no mesmo domicílio, inexistência de quadro de carreira na empresa.
- Princípio de substituição automática das cláusulas contratuais pelas disposições coletivas: CF/88 – arts. 7º. (VI, XIII, XIV, XXVI), 8º. (III) e 114 pgf. 2º. CLT: 620
Portanto a hipossuficiência e o engessamento da relação laboral advém diretamente da constituição e se quisermos modificar e modernizar as relações laborais a mudança tem que ser por emenda constitucional.